A disputa pelo Essequibo, antes circunscrita ao litígio histórico entre Venezuela e Guiana, hoje se transformou em palco de uma disputa global. O que se observa no mar do Caribe e nas águas próximas ao litoral venezuelano não é apenas a presença ostensiva de navios norte-americanos, mas o somatório de forças de países-chave da OTAN: Holanda, Canadá, França e Reino Unido. Sem que a aliança atue oficialmente, constrói-se uma malha de dissuasão “por osmose”, em que bandeiras nacionais operam em conjunto, sob interoperabilidade garantida por Washington e pelo Comando Sul.
Essa arquitetura naval reforça o cerco diplomático e militar sobre Caracas, com justificativas públicas que variam entre “combate ao narcotráfico” e “garantia da segurança marítima”. Mas, na prática, projeta um arco de contenção contra a Venezuela, criando riscos concretos à sua soberania marítima e ao seu direito de explorar e defender seu território e suas águas. A equação fica ainda mais sensível porque o petróleo do Stabroek, na Guiana, é hoje uma das maiores descobertas globais do século, operada por gigantes como ExxonMobil, Hess e Chevron. Cada navio aliado no Caribe representa, portanto, não apenas poder militar, mas também escudo corporativo para garantir o fluxo de capital energético.
O resultado imediato é claro: a Venezuela se vê cercada por forças que, embora não carreguem formalmente a bandeira da OTAN, operam como se estivessem em missão conjunta. Um OTAN informal que se instala à sua porta, transformando a disputa pelo Essequibo em uma peça central da nova geopolítica do Atlântico.
Entre os dias 21 e 24 de agosto, o Caribe e o mar da Venezuela viveram um aumento notável de tensão. A presença de três destroyers norte-americanos classe Arleigh Burke, USS Gravely, USS Jason Dunham e USS Sampson, foi confirmada em águas internacionais próximas à costa venezuelana. Oficialmente, sua missão está ligada ao combate ao narcotráfico, mas, na prática, trata-se de uma demonstração de força, com navios equipados com sistemas Aegis capazes de neutralizar tanto aeronaves quanto mísseis em cenários de alta intensidade.
A movimentação não se limita aos EUA. Holanda e Canadá, em coordenação com o Comando Sul, mantiveram operações de interdição no arco de Aruba, Bonaire e Curaçao. Em duas apreensões recentes, patrulhas holandesas com equipes da Guarda Costeira dos EUA embarcadas interceptaram embarcações a menos de 30 milhas da costa venezuelana. O Canadá, via Operação CARIBBE, intensificou sua presença com navios de patrulha costeira, interoperando com os holandeses e reforçando o cerco naval.
No plano regional, a França deu um passo além: unidades das Forças Armadas estacionadas na Guiana Francesa realizaram exercícios de vigilância marítima e fizeram escala em Georgetown, sinalizando apoio explícito à Guiana no litígio. O gesto, embora apresentado como “cooperação de segurança”, tem peso simbólico: Paris projeta sua bandeira na fronteira direta do Essequibo.
Enquanto isso, no território venezuelano, o governo de Nicolás Maduro anunciou a mobilização da Milícia Bolivariana, convocando novos alistamentos e endurecendo o discurso de “defesa da soberania”. A ordem coincidiu com a intensificação das patrulhas aliadas no Caribe e funcionou como resposta política e militar imediata.
O ambiente é ainda mais instável porque o esquadrão anfíbio Iwo Jima dos EUA, previsto para deslocar-se ao Caribe, precisou alterar rota devido ao furacão Erin. Isso atrasou a presença anfíbia de marines, mas não diminuiu a percepção de cerco: na prática, a escada de prontidão militar já está montada, e qualquer incidente de abordagem ou sobrevoo arriscado pode funcionar como gatilho para uma crise maior.
Em resumo: em menos de uma semana, a região saiu do patamar de “patrulha de rotina” para um quadro de pressão direta sobre Caracas, em que cada novo navio ou exercício militar reforça a narrativa de isolamento e ameaça à soberania venezuelana.